terça-feira, 4 de agosto de 2009

03 DE FEVEREIRO DE 1999

Ainda estou assustada com a minha decisão. Já entrei com os papéis para revisão do meu processo de aposentadoria. Já não sei o que será de mim agora (isto é verso de alguma letra de música). No fundo estou feliz. Cansei de ver aquelas mesmas caras todo dia. Até dos meus alunos estou enjoando. Afinal, apesar da minha paciência, ficar ensinando o que não se aprende é complicado. E tem mais, estes modismos pedagógicos que a coordenação eo governo quer nos enfiar goela abaixo já me cansaram. Quer saber mais, daqui p'rá frente você será meu confidente querido e eu até o chamarei de "Ti", apelido carinhoso para mim mesma. Prometo não voltar a falar sobre escola, aluno, ou qualquer outro assunto que me remeta a este passado que estou prestes a abandonar. Vou falar de vida, dinheiro (ai,ai) e até de televisão. Quem sabe comece a conversar sobre novelas - detesto - mas veja bem, agora eu sou uma quase aposentada que vai ter tempo para tudo. Quero deixar registrado que não contei para ninguém a minha intenção de não voltar este ano para lecionar. Também, eu não gosto de festinhas de despedida e como sou muito emotiva é capaz de eu até desistir e continuar na ativa. Bem que eu sei que vou sentir falta daqueles moleques do primeiro ano do ensino médio. Sabe Ti, eles até que são bons. Faltou um pouco de carinho e orientações da família mas nada que uma palavra de incentivo não faça com que eles ouçam a gente. Ei! falei que isto agora é assunto proibido. Escola nunca mais...never...jamé!!! (rs) Até quando?

O DIA EM QUE QUIS FAZER DO DIÁRIO DE UMA QUASE APOSENTADA UMA HISTÒRIA QUE NÃO ERA MINHA

Não foram fáceis as negociações para a publicação do "Diário de Uma Quase Aposentada". Envolveu até a alta cúpula de renomado Instituto Educacional na garantia do anonimato da autora. Posto isto, percebo a enorme responsabilidade de transcrever, da forma mais discreta possível, os relatos e nomes de pessoas que quase diariamente fizeram parte desta trajetória. Algumas características sobre a pessoa que escreveu podem ser relacionadas, visto que, se parecem com o de milhões de outros aposentados neste país. Haja vista que, na área da educação, o perfil se encaixa muito bem. Sexo feminino, nem feia nem bonita, nem gorda nem magra, não muito velha mas, definitivamente, não tão jovem. O pouco tempo com dedicação, às vezes, em jornadas de até três turnos de trabalho e o salário com sobrevida apenas na primeira semana do mês inviabilizam recursos para uns, "botox da vida" ,de vez em quando.
Outra situação análoga a de outros aposentados é a idade. Mesmo com a vigência da lei - atualmente permite a aposentadoria para educadoras a partir de 50 anos e 35 de contribuição previdenciária - houve época em que com 25 anos de efetivo exercício na função podia se aposentar. Este foi o caso da nossa personagem que começou a atuar como professora aos 18 anos portanto, aos 43, estava aposentada. Apesar de já ter dado tudo de si desde a mais tenra idade o jeito foi voltar à ativa. Aqui começa esta jornada de quem era mas não podia ter sido. Aliás, lembrei de uma antiga professora de francês que ministrava aulas em um educandário público mas, de renome, na capital mineira. Aos 70 e muitos anos de idade não abria mão do seu trabalho. Andava com seu vestidão estampado, os olhos claros pintados de lápis preto que ao fim das aulas ficavam borrados. O rosto ainda guardava as feições de uma mulher bonita e era emoldurado por cabelos compridos e lisos mas já desbotados pelo tempo. Tornou-se uma figura lendária e só se afastou após, quase, um processo administrativo. Por isto, quando alguém tinha direito à aposentadoria e continuava na ativa era chamado pelo nome da professora em meio à gargalhadas de zombaria. Talvez isto fosse motivo para muita gente aproveitar logo do benefício mesmo tendo ainda muito para oferecer na área de atuação que nem o meu caso. Ei!!! Acho que a personagem está sendo eu. Ah! Dona Márcia, lembra-se da professora de Língua portuguesa da faculdade? Quando afirmou que Clarice Lispector era ela mesma personagem de seus contos e quando escrevia o também glorioso Guimarães Rosa, apenas reportava "seus causos" às lides de seus encantos? Foi advertida que para a "Literatura Portuguesa" precisamos nos reportar à algumas regras da escrita que primeiro passa pela criação de personagens. Obrigada querida professora da matéria ( por sinal, linda e sofrida). Passei com total de pontos em todas as avaliações. Mas, coisa minha: ainda acho que, quem escreve e sensibiliza, com certeza, só escreve sobre sua própria vida.

Somos quem somos porque queremos.

É sério! A gente tem a chance de sonhar os sonhos que a gente quer. Daí a realizá-los é uma questão pessoal de luta, discernimento e vontade de vencer!

Arquivo do blog

Minha foto
BH, MG, Brazil
Sou na luta pela vida, alguém que não desconhece seus iguais. Sonha com a pureza de realizar algo que consiga sensibilizar o rude de coração e convencer o incrédulo que o amor existe se a gente deixar de amar só a nós mesmos.